A estória que Herr Salazar nos conta fez-me recordar nalguns pontos um outro conto, publicado no espaço "Os amigos de Allah", a minha página internet de sabedoria e heresia.
Abaixo o podeis encontrar:
"A história do Beduíno Jardim", publicada a 4 Julho de 2005
Madeira, ano 2 D.C.*
A Novembro desse ano, a ilha da Madeira foi assolada por terríveis ventos vindos do continente africano, os quais transportaram para a ilha fauna africana de diversos tipos: insectos, répteis (crocodilos, iguanas, jacarés), mamíferos (lebres, cavalos, ursos), peixes voadores, etc. Foi um episódio do género arca de Noé, mas pelo ar, patrocinado pelo grande mecenas Allah o Grande.
Como não ficou descrito em nenhum livro sagrado, é hoje um episódio caído no esquecimento.
Na verdade, é um episódio que pouco tem de extraordinário na sua essência, mas que explica o aparecimento de um dos personagens mais activos na cena cultural portuguesa: Alberto João Jardim.
Bagui era um beduíno das florestas tropicais do Gabão, mas que tinha nascido com uma vantagem evolutiva face aos restantes beduínos selvagens gaboneses: falava português. Os pais, sabendo das suas qualidades, insistiram para que se metesse a caminho e buscasse a sorte para lá da selva gabanesa, onde os rios corriam com mais água e onde as árvores nasciam com mais frutos. Bagui fez-se à estrada e saiu do Gabão, passeou pelo Quénia, pelo Chad, pelo Senegal. Deu uns tiros em Angola, fez amigos na Guiné Conacri e bebeu água dos oasis do Sahara. No entanto, ao sair do Sahara, foi colhido por ventos faraónicos e juntou-se a um safari aéreo com destino à Madeira. Aí conheceu camelos, jacarés, lontras, hipopótamos e libelinhas. Conheceu também Citlali, uma pujante orca acéfala que escravizou o pobre Bagui, até que este a engravidasse. Mais ou menos pelo meridiano 36 ocorreu a fecundação, e a orca Citlali libertou o pobre Bagui, que foi de imediato comido por um leão escarlate esfomeado do Sudão.
Por volta da semana 1276 de gestação, e apenas a 2 do parto esperado, a orca Citlali sentiu-se sem forças e fez-se arrastar até à costa da ilha onde morreu de cirrose crónica. Contudo, dentro de si levava vida. Uma criatura medonha, que saiu a muito custo do volumoso corpo da sua mãe Citlali, tendo pelo caminho devorado algumas das suas vísceras e bebido algum do seu leite putrefacto. Autointitulava-se Alberto João, rei da Madeira e do Carnaval, e nasceu com um cérebro igual ao da mamã, e um jeito para o português igual ao do pai. Depressa se refugiou na mata densa da madeira, junto com as iguanas e os escaravelhos assassinos do Cairo. Aí, aproveitando-se do seu odor nauseabundo, causou o pânico e fez-se muito jovem o rei da floresta. Alimentava-se de todo o tipo de detritos sólidos e líquidos, dotando o ecossistema de um equilíbrio invejável. Chamavam-lhe o Ecoponto.
Fez toda uma vida mergulhado na floresta, até que por volta dos anos 60 (1960), sentiu um chamamento do mundo civilizado - a política. Integrou-se num partido ao seu nível, e aí fez carreira. Continua o rei da selva, com um cheiro nauseabundo. Sai à rua quando há carnaval, e pensa como a mãezinha Citlali. Ainda hoje se alimenta de detritos, e tudo o que diz se resume a uma palavra: Lixo. Lixo, do qual se volta a alimentar e a contribuir para um mundo mais limpo. E continua a dar-se pelo nome Ecoponto!
*Nota: ano 2 D.C. refere-se a ano 2 "Depois de Cristo", isto é, a 2 anos depois do Baltazar, Gaspar e Belchior se terem deslocado casualmente em 3 camelos sanguinários do deserto da Eritreia a um lugar chamado Belém, guiados por uma estrela qualquer e alguns charros a mais, acabando por assistir a um parto fortuíto de uma família de judeus que por não terem dinheiro para um hotel, estavam refugiados numa gruta malcheirosa e acompanhados por um burro e um cabrito ou qualquer coisa do género.
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